Chimas 03: Solidariedade e ancestralidade

O Chimas Corte Singular Nº 03 é um projeto que nasce da herança primordial da união e celebra a diversidade e a conexão entre as pessoas, os povos e a natureza

Por Júlio César Kunz

Diretor de Relações Institucionais da ABS-RS e vice-presidente da ABS Brasil

Jeferson Soldi

O Cacique Maurício Kaigang Kamé e sua família foram convidados para o leilão beneficente Chimas Corte Singular nº3, sendo homenageados pela presidente Caroline Dani e o idealizador do projeto, Júlio César Kunz, também diretor de relações institucionais da ABS-RS

A seção gaúcha da Associação Brasileira de Sommeliers reconhece o povo Kaingang como os tutores tradicionais do território da Serra Gaúcha. Assim como os povos Charrua, Mbyá-Guarani e Xokleng em outras regiões do estado do Rio Grande do Sul. Reconhecemos a sua conexão contínua com as terras e com as águas, suas irmãs. Nós os agradecemos por proteger os biomas mata atlântica, pampa e o sistema costeiro marinho desde tempos imemoriais, hoje, fonte de diversidade e a base dos valorosos terroirs nos quais se desenvolvem os vinhos gaúchos. Apresentamos nossos respeitos aos caciques e anciãos passados, presentes e futuros, estendendo esse respeito a todos os povos originários do território que hoje chamamos de Brasil.

O Chimas Corte Singular Nº 03 é um vinho que nasce da herança primordial da união e celebra a diversidade e a conexão entre as pessoas, os povos e a natureza. Batizado em referência ao Chimarrão, expressão dessas terras através da erva-mate, e principalmente ao bonito hábito de compartilhar, na bebida, da companhia e das histórias ancestrais que nos movem.

O vinho é fundado na ancestralidade, em mitos e ritos que passam de geração em geração, como o Chimas passa de mão em mão. Uma nova era do vinho brasileiro nasceu no Brasil com a chegada dos imigrantes italianos no fim do século XIX - porta aberta que faz, hoje, o vinho ser uma verdadeira bebida nacional. Isso é História - com H maiúsculo - mas junto com a história vêm os mitos. E dentre os que têm antepassados italianos, sabe-se bem o tamanho dos esforços daqueles que deixaram a sua terra natal para “far la cucagna”.

Mas há uma parte dessa história que não é suficientemente contada, e que não diminui o valor e heroísmo daqueles trabalhadores humildes que atravessaram o atlântico com sua coragem. Costumam nos dizer que os imigrantes, ao chegarem nada encontraram. Na verdade, eles saíram de um lugar que nada mais tinha para lhes dar: uma Europa empobrecida por longos períodos de guerras, sempre destrutivas. Ao chegarem no Brasil, eles encontraram o que precisavam para se desenvolver.

Antes do desembarque dos imigrantes, foram séculos de cuidado deste território, trabalho dos povos originários que, em vez de uma separação entre humanos e o resto da natureza, procuram compreender sua conexão: somos parte de um todo. E foi essa herança que ofereceu aos antepassados italianos pinhões e carne de caça abundante, uma rica variedade de frutas nativas e madeira para a construção de suas primeiras casas, móveis e barris.

Este ano a natureza nos lembrou pela sua face mais assustadora que não há fronteiras suficientes. A emergência climática é uma realidade que se impõe de todos os lados e em todos os cantos do mundo. A ciência nos mostra que a desconexão entre seres humanos e o meio ambiente é responsável pelos enormes desafios que vivemos, e temos a responsabilidade de buscar alternativas para frear a emergência climática que afeta milhões ao redor do planeta, colocando em jogo a própria existência humana. Urge adiar o fim do mundo!

Urge adiar as mudanças de terroirs que alteram estilos de vinhos clássicos, que mudam cortes tradicionais e que colocam em risco a produção de 70% dos vinhedos históricos do planeta. O Rio Grande do Sul pagou com 250 hectares de vinhas perdidas nas últimas enchentes só em 2024.

No ano de 2024 e em 2025, a ABS-RS está trabalhando para ajudar a reconstruir uma escola, é para essa finalidade que serão utilizados os fundos arrecadados pelo leilão do Chimas Corte Singular Nº 03, através da Fundação Sou de Fazer, criada durante as enchentes. Um trabalho de reconstrução que ainda não acabou. E temos também um trabalho de construção para um futuro mais integrado, unindo os saberes de todas as culturas. A cultura do vinho também tem a sua contribuição a dar, pois é na íntima conexão entre povos e a terra que emergem os terroirs de excelência.

Um brinde à amizade entre os povos!

Um brinde à solidariedade!

Viva o vinho brasileiro!

Viva a sommellerie brasileira!